10.3.06

Querido M.P.,

Não vou mentir que quase não acreditei quando soube que havia ido embora, mas eu quase não acredito em quase tudo. Por que tão repentinamente? Por que tanta fuga? Mas fico feliz com o que diz a carta, com a ocupação da mente com a ocupação do corpo.
Eu não consigo mais fugir do dióxido de carbono, definitivamente. E acho mesmo que é disso que vou morrer, essa minha urbanicidade. Fumantes compulsivos, insones não combinam muito com pássaros e flores, sinto como se tivesse nascido do concreto, do cinza, do asfalto, filha dos prédios e do caos. Tenho desejos de uma velhice mais bucólica, mas ainda têm que acontecer milhões de desprendimentos, a morte de algumas paixões (pela noite, pela morte de todos os dias, pelo barulho, pelos movimentos acadêmicos...). Como viver sem a produção intelectual e sem a pressão? Rs. Sinto me fazendo uma apologia à angústia da contemporaneidade, mas é só um pouco de verdade, entre tantas mentiras que contamos e nas quais fingimos acreditar.
Por causa dessa dualidade, verdade - mentira que é tão complicado (sempre) te escrever. Por que mentir para ti seria uma tentativa de me enganar e eu não suporto essa idéia. Frente a ti não nada há além de uma mulher, não posso montar personagens, nem estórias, nem cores, nem fadas. Não há lúdico (ou tudo é tão fantasioso que na minha loucura psicótica, é tudo o que eu sou, sem de fato ser).
Aceite o convite do padre. Produzir intelectualmente é tão vital quanto o milho e a mandioca, além do que essas pessoas precisam saber disso também.

Já sinto saudades.

Cheiro grande.

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