Querido,
quero que me desculpe, se demoro a responder suas cartas. Tenho me sentido cansada. Reconheço com felicidade sua boa vontade, seu ânimo, mas temo que não esteja a par dos últimos acontecimentos.
Sei de minha dramaticidade e já debatemos, sim, por horas acerca de meu desejo obscuro de morrer de maneira gloriosa. Essa não é uma delas. Já faz alguns meses que não nos falamos, portanto não é de se estranhar seu desconhecimento. Querido, foi descoberta em mim uma síndrome raríssima, cujo nome é tão complexo que não me ocuparei em escrevê lo por que não faz a menor diferença. Segundo os médicos, ela não necessariamente me matará, mas venho sendo submetida a alguns procedimentos: exames, coletas, experiências... Algo me diz que eles, os cientistas, médicos e especialistas estão completamente perdidos. Não sabem, em absoluto, o que estão fazendo.
Cá do lado das cobaias, tenho me sentido tranquila. Embora, vez por outra, alguém adentre o quarto com olhares de despedida e eu mesma pense sobre a morte diariamente. Não quero ter medo, nem me arrepender, nem rezar. De alguma maneira, algo me certifica de que não será dessa vez. Lembra de quando me acidentei no carro? Bêbada e louca, quem me aconselharia a dirigir? Apesar da quinzena em coma, saí ilesa. Naquela ocasião eu também me sentia intuitivamente segura... Mas há sempre o encontro daquilo que sentimos com aquilo que queremos sentir, então prefiro me abster de opiniões definitivas, assim como os médicos.
Tenho sonhado muito, todos os dias, em diferentes momentos. Chego a crer que venho sonhando acordada. Podem ser alucinações... São sempre sonhos claros, vivos, deliciosos... Dias de sol, voando por sobre o mar. Sonhei, certa vez com você me fazendo carinho nos cabelos e sorrindo, dizendo que seria pai e que seria lindo.
Querido, é preciso envergar para não quebrar.
Amanhã irei à praia, vai ser lindo.
Beijos de saudade.
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